O conceito de humanização do parto se contrapõe à ideia de medicalização do ato de dar à luz. Não de forma antagônica e excludente, porque o intuito não é negar os recursos médicos disponíveis, mas complementar a abrangência da assistência para além dos resultados clínicos. É compreender o parto como um evento não apenas biológico, mas também social, cultural e psíquico de elevada relevância na vida da mulher.
Houve um tempo em que a mulher entrava em trabalho de parto sem saber se ela e/ou o bebê sairiam vivos dessa experiência. As possibilidades de nascimento e morte andavam lado a lado no imaginário da gestante. Isso levou a um movimento de busca por técnicas e procedimentos que visassem reduzir ao máximo os riscos associados ao parto.
Se o avanço da ciência e tecnologia, por um lado, permitiu a redução dos índices de mortalidade e complicações relacionadas à gravidez, por outro, também levou à sistematização de práticas e intervenções que nem sempre se provaram benéficas. Conceitos de regular, acelerar e mesmo terminar o parto foram substituindo as antigas práticas de observar, assistir e apoiar. A mulher foi deixando de ser agente para ser, pouco a pouco, encarada como objeto no processo de parturição.
Felizmente, esse modelo quase industrial de assistência vem sendo questionado. O avanço de movimentos pró-empoderamento feminino na esfera da maternidade trouxe à tona a discussão sobre a autonomia da mulher na escolha sobre a melhor forma de parir. Aspectos emocionais, culturais e espirituais associados ao nascimento passaram a ser reivindicados. E a questão do parto deixou de ser uma preocupação com a sobrevivência e passou a ser uma busca pela expressão plena de todo o potencial de vida e saúde de uma mulher.
Assim, os cuidados com a segurança do parto não mais justificam a retirada do papel de protagonista da gestante. Protocolos clínicos podem ser individualizados e a tomada de decisões deve ser compartilhada. Seu corpo, suas regras. Lógico que algumas situações de emergência podem requerer ação imediata da equipe de saúde, mas a maioria das medidas pode ser previamente discutida e uma comunicação efetiva e respeitosa garante que a mulher se sinta amparada e não invadida.
Gravidez não é doença e parto não é procedimento. São, acima de tudo, vivências que modificam profundamente a vida da mulher e de toda a família envolvida. E a humanização do parto nada mais é que o respeito a esse momento tão particular, levando em consideração a mulher como pessoa única, que necessita de atenção e cuidado; o bebê que tem direito a um nascimento sadio e harmonioso; e a família em formação que necessita construir e fortalecer vínculos com intimidade. O parto humanizado é aquele que garante a adoção de práticas não apenas seguras, mas que apoiem esse caráter único e transformador do ato de dar à luz.
Entenda de que formas você pode ter uma assistência humanizada:
o Discutindo ao longo do pré-natal suas preferências quanto à realização ou não de certos tipos intervenções, e entender as situações de emergência que podem requer a ação imediata da equipe;
o Manifestando seus desejos e tendo seus anseios acolhidos, através de uma relação de confiança com sua equipe;
o Elaborando um plano individual de parto;
o Tendo suas dúvidas esclarecidas com informações e explicações satisfatórias;
o Garantindo o apoio de seu acompanhante, doula e profissionais de saúde;
o Tendo um ambiente para o parto seguro, acolhedor, silencioso e privativo;
o Podendo deambular e se movimentar livremente durante o trabalho de parto;
o Recebendo monitoração adequada do bem estar da mãe e do bebê;
o Sendo oferecidas opções não-farmacológicas e farmacológicas para alívio da dor;
o Escolhendo a posição que deseja parir;
o Colocando o bebê em contato pele a pele com a mãe, assim que nascer e durante a primeira hora de vida;
o Incentivando a amamentação na sala de parto e apoiando o aleitamento exclusivo em livre demanda;
Além do ambiente formal do consultório, as gestantes em acompanhamento pré-natal com a nossa equipe têm a oportunidade de participar de encontros periódicos com outras grávidas, onde dividem suas dúvidas e expectativas em rodas de conversa.
Participam dessas reuniões os 4 obstetras do Grupo Afeto, um dos pediatras e anestesistas da equipe, as futuras mamães, seus companheiros ou acompanhantes, além de eventuais convidados (doulas, enfermeiras, consultoras de amamentação, etc)
É um ambiente de troca muito rico, onde todos os participantes, médicos e pacientes, aprendem muito. Essa interação permite às gestantes fortalecer o vínculo com seu obstetra, conhecer os outros integrantes da equipe que a ajudará no momento do parto, engajar sua parceiria na preparação para o parto e criar uma rede de apoio entre as grávidas. O resultado desses encontros tem sido muito positivo e só nos confirma que juntos somos sempre mais fortes!
Os cuidados com as mulheres gestantes não se encerram quando o bebê nasce.
É verdade que a gente passa a maior parte do pré-natal focada na preparação para o parto, mas não podemos deixar de pensar nos desafios que o puerpério pode trazer.
E por mais que a gente busque conversar sobre as dificuldades potenciais, só quem está passando por elas consegue dimensionar o tamanho dos obstáculos encontrados.
Ter uma rede de apoio para dividir experiências, relativizar alguns problemas e buscar soluções para outros, é fundamental para superar os momentos de turbulência.
Foi pensando nisso que passamos a criar grupos de apoio formados pelas puérperas do Grupo Afeto. A cada 3 meses, reunimos no Whatsapp um grupo de “recém-mães” que, trocando mensagens, descobrem que não estão sozinhas e estão na verdade vivenciando situações muito semelhantes.
O resultado dessas trocas tem sido emocionante de acompanhar. Vemos surgir verdadeiras amizades em cada grupo novo criado, e volta e meia somos convidados a participar dos aniversários coletivos dos “Afetinhos” – apelido que deram aos bebês que nascem com o Grupo Afeto.
Ficamos muito felizes em ver a sementinha do cuidado que plantamos gerando lindos frutos.
Nossos grupos sempre começam assim:
“ Outro dia vocês eram nossas grávidas e agora são todas super mães descoladas e desenvoltas que dão conta de tudo sem titubear, sem hesitar, sem chorar, sem duvidar e sem querer jogar tudo pra cima e fugir pra Jericoacoara, não é mesmo?
Calma. A gente sabe que não. A gente sabe dos perrengues do puerpério e a gente sabe da solidão. Só que a gente também sabe que há alento pra toda fase difícil na vida. E a gente acredita na força das redes de afeto.
Por isso criamos a cada 3 meses um grupo com as puérperas da equipe. Porque todo fardo é mais leve quando compartilhado. Aproveitem e conectem-se. Se não for a onda de vcs, a ideia não lhes agradar e vcs quiserem cair fora, fiquem à vontade que ninguém se ressente. A gente vai facilitar este primeiro encontro e em seguida vai deixar o grupo na esperança que laços preciosos se formem e que vcs sigam podendo contar umas com as outras. ❤❤❤”